DIREITOS FUNDAMENTAIS: a efetivação das garantias fundamentais como uma obrigação estatal

Saber é angustiante. No primeiro semestre do curso de Direito, um professor trouxe essa ideia à tona e nos perguntou se preferíamos manter nossa ignorância, sendo feliz com ela, ou se gostaríamos de descobrir a verdade e sofrer com essa. Eu respondi que preferia a ignorância. É sempre mais fácil não saber, é sempre mais leve não enxergar o dever-ser face ao que realmente se é.

Era nesse mesmo contexto que eu, ainda na minha ignorância, acreditava que direitos humanos era só uma desculpa para a manutenção de privilégios extensivos a alguns e para a falta de comprometimento do Estado em punir aqueles que mereciam. E é assim que grande parte da sociedade leiga enxerga tal instituto.

É para essa sociedade que eu escrevo aqui. Saibam, é dever do Estado guardar nossas garantias fundamentais. Essas garantias não são regalias, não são privilégios. São o mínimo existencial para a sobrevivência de um indivíduo, de uma família, dentro de uma sociedade desigual e injusta, ora em face do Estado, ora em face de um particular.

A ideia de direitos fundamentais remonta a diversos ramos de estudo e análise, considerando ser um instituto extremamente amplo, de forma que, em virtude dessa amplitude, grande parte dos doutrinadores não chega a um conceito exato. Aqui, considero que os direitos fundamentais seriam os direitos trazidos pela Constituição da República como a base da vida humana digna, a partir da ideia dos direitos humanos ou do homem, isto é, direitos e garantias
constitucionalizados.

Portanto, temos que a Constituição de 1988 foi o resultado de uma extensa luta por democracia e garantias fundamentais, consolidando a ruptura do regime militar instaurado em 1964. Essas garantias remontam até mesmo ao Preâmbulo Constitucional, de maneira a apontar que, antes de se demonstrar toda a organização e manutenção do Poder Público, devem ser sabidos os direitos e garantias básicas daqueles que formam esse Estado.

Enganam-se aqueles que acreditam que o Poder Público promove programas sociais no intuito de somente sustentar algumas minorias (ou maiorias) e ganhar votos. Se esses programas sociais não são materializados, então o governo não está cumprindo com sua obrigação constitucional e com o objetivo básico que une o Brasil em um Estado Democrático de Direito. Todo o funcionamento do Poder Público, sua distribuição administrativa e seus fins são voltados para a efetivação dos direitos fundamentais.

Assim, o Estado não está privilegiando “marginais” e minorias, e sim garantindo que esses tenham uma condição mínima de dignidade para a sobrevivência. Não é “adotar um bandido” punir uma pessoa que tatua algo na testa de outra sem seu consentimento – a tortura é vedada no Estado brasileiro. Não é ir contra os “valores familiares” permitir o casamento entre pessoas do mesmo gênero – a Constituição garante a liberdade sexual de cada um e protege todo e qualquer tipo de família. Não é injusto promover as cotas raciais – a Constituição exige políticas para o combate de preconceitos e da desigualdade social.

São incabíveis tais comportamentos e discursos de intolerância em uma sociedade tão diversificada. A Constituição da República procura proteger e promover todos os grupos sociais possíveis, de maneira que o fato do Poder Público reagir a essas situações dessa forma não é deixar alguém impune ou “desmoralizar” a sociedade brasileira. É obrigação do estado a efetivação de todas as garantias constitucionais, independentemente de como isso vai ser conveniente para um ou para o outro.

O que se vê é que grande parte da sociedade brasileira exige do Estado reações heroicas a todo momento, desde que sejam beneficentes a determinado grupo. Essa se esquece que vivemos em um Estado Democrático. Não haverá efetiva democracia e efetivo avanço social se não forem feitos sacrifícios de todos os lados para a promoção da igualdade dentro de tal sociedade.

Enxergar essas obrigações do Estado, embasadas legalmente, e ver que ainda há pessoas que não as admitem por mera discriminação e individualismo é angustiante. Saber que há políticas que de fato procuram cumprir com os fins constitucionalizados do Estado brasileiro e que ainda sim são criticadas por grupos que não admitem não serem privilegiados por um momento sequer é angustiante.

Há uma parcela da sociedade que opta por fechar os olhos para a realidade de grande parte do brasileiros, impedindo, de diversas formas, a promoção das prerrogativas fundamentais de outros grupos. Optam por continuar no escuro para que não tenham que abrir mão de seus direitos e, muitas vezes, de seus privilégios.

Saibam, permitir que outros também tenham garantias básicas não irá suprimir as suas. Saibam, saber é angustiante, mas optar pela ignorância é ainda pior.

Fernanda Menezes

Monitora das disciplinas Direito Constitucional I e Direito Constitucional II