Aula inaugural da Faculdade Mineira de Direito com Ciro Gomes
Raphael Calixto
Ciro Gomes disse que o Brasil está gravemente doente, tem que levá-lo a tratamento, mas pode ser salvo, por meio de um plano nacional de desenvolvimento econômico
“A nossa PUC Minas, uma escola que todos nós cultivamos um bom pensar acadêmico a excelência do esforço da pesquisa, do estudo, da avaliação, da aplicação desse conhecimento na vida da sociedade. Nós que formamos na ciência e na tecnologia temos um profundo respeito por esta Instituição”. A afirmação foi feita pelo ex-candidato à Presidência da República Ciro Gomes, advogado e professor universitário, durante a aula inaugural da Faculdade Mineira da PUC Minas. O evento foi realizado na manhã desta segunda-feira, 16 de setembro, no Teatro João Paulo II (prédio 30), Campus Coração Eucarístico.
Ex-ministro da Fazenda e ex-ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes creditou à importância da instituição universidade para o desenvolvimento, como acontece nos EUA, na China e Coreia do Sul. De acordo com ele, ciência e tecnologia, o nome atual para desenvolvimento, estão banidos pelo atual governo brasileiro.
Ciro Gomes disse que o Brasil está gravemente doente, tem que levá-lo a tratamento, mas pode ser salvo, por meio de um plano nacional de desenvolvimento econômico. “A economia para ter emprego tem que crescer”. Para ele, é uma falácia dizer que o desenvolvimento brasileiro se financia com o capital externo, que atualmente está muito mais caro do que na época do chamado “milagre econômico”. Dos anos 1980 até hoje, em média foram 2% ao ano de crescimento econômico, e a população brasileira nesse período cresceu 1,7% em média.
Ciro Gomes disse que a cirurgia que o Brasil necessita viria com a construção da própria poupança interna do país, deixando de lado a ilusão de que o desenvolvimento poder-se-ia ser financiado com o capital externo; também deixar de lado a ideia ilusória de que o mercado conseguiria tudo resolver; e substituir a “ideologia de quinta categoria” (como denomina a que está em curso no país) por ciência, um Estado forte, iniciativa empreendedora e uma academia (universidade) em produzir respostas técnicas e científicas para respostas da sociedade. Para ele, o Estado deve alavancar obras de infraestrutura, diante de uma indústria brasileira sucateada, explosivo endividamento empresarial e colapso no investimento
Para exemplificar sobre a necessidade desse plano nacional de desenvolvimento econômico, Ciro Gomes comparou o Brasil dos anos 1980, o qual detinha 1% do comércio do mundo, tendo 160 milhões de habitantes; e a China, com a mesma representatividade no comércio mundial àquela época, mas com uma população cinco vezes maior. Atualmente, a China possui o tamanho 12 vezes da produção industrial brasileira.
De acordo com Ciro Gomes, há um fenômeno de massa no qual há uma engenharia econômica perversa. São atualmente, de acordo com Ciro Gomes, 14 milhões de desempregados; 41 milhões de pessoas na informalidade; mais de 63 milhões com o nome no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), desses 5 milhões de estudantes inadimplentes por causa do Fies. Citou que nos últimos três anos foram fechadas 13 mil indústrias, 220 mil pontos de comércio e mais de 5 milhões de microempresas ou estão na recuperação judicial ou a ponto de vir a pedi-la. “O problema não foi criado por (presidente) Bolsonaro, ele está agravando-o”.
Para mostrar que o Brasil crescia, disse que o país tinha um projeto nacional de desenvolvimento no século passado. E são duas as premissas que explicariam o porquê o país parou de crescer: o capital se tornou mais caro e as elites acabaram por agravar esse caminho.
“Um país não fecha. Quando ele quebra, os sintomas de quebrar são esses crônicos, que ele não cresce mais, não gera mais emprego, não aposta em infraestrutura. Mas tem um sintoma agudo e de fácil percepção entre todos nós e que hoje está nos desafiando, que é a taxa de câmbio. Ninguém precisa ser economista. Ninguém compra dólar, mas o dólar é um preço que contamina todos os preços da vida de todos. Quer ver? Você não compra dólar, mas você come pão. Pão é trigo, e o Brasil não produz trigo o suficiente. E agora, Bolsonaro autorizou sem ninguém entender o porquê, uma importação de trigo subsidiada pelos Estados Unidos de 750 mil toneladas”, disse Ciro Gomes, referindo-se à dualidade com que setores, como o agronegócio, apesar de apoiar o governo percebem uma “confusão mental e prostração ideológica”.
“Mais cedo ou mais tarde, esse preço vai para o pão. A gente não compra dólar, mas anda de ônibus. Essa gente paralisou a produção brasileira nas refinarias (de petróleo). Um terço delas está parada, e o Brasil está praticando a genial política de exportar petróleo bruto barato e comprar em dólar gasolina óleo diesel, gás de cozinha e querosene de aviação do estrangeiro, 80% dos americanos. Vamos importar esse ano 300 milhões de barris desses derivados de petróleo, poderíamos produzir aqui em real”, ponderou.
Ciro Gomes disse não crer que a democracia brasileira esteja ameaçada, mas lembrou da necessidade de a sociedade protegê-la.
Compuseram a mesa de abertura os professores Guilherme Coelho Colen, diretor da Faculdade Mineira de Direito; Wilba Lúcia Maia Bernardes, chefe do Departamento e coordenadora do curso no Campus Coração Eucarístico; Alice de Souza Birchal, desembargadora do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG); e a aluna Beatriz Almeida Gonçalves, representando o Diretório Acadêmico de Direito.
Raphael Calixto
Os professores Alice Birchal, Ciro Gomes, Guilherme Colen, Wilba Bernardes e a estudante Beatriz Almeida
O diretor da Faculdade Mineira de Direito disse que é uma satisfação a PUC Minas receber o conferencista, já que lugar de professor é na universidade, espaço de ideias e de liberdade. Nas palavras do reitor Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, disse que a Universidade está sempre aberta para ouvir ideias. O professor Guilherme Colen disse que em 2020 a Faculdade Mineira de Direito completará 70 anos de exitosa existência e ressaltou a formação humanista proporcionada pela FMD na formação do cidadão. Complementou dizendo que a FMD integra os 10% de faculdades de direito no Brasil que detêm o OAB Recomenda, selo outorgado pela Ordem dos Advogados do Brasil.
A professora Wilba Bernardes disse que a escolha pelo conferencista se deve à necessidade de se reforçar o ideal democrático da FMD ao momento em que o país pede pluralismo, diversidade e dignidade da pessoa humana. “Esta é uma missão da PUC Minas. Isso está em nosso projeto pedagógico e está no PDI da Universidade. Tentamos aqui formar não só operadores de Direito, mas cidadãos. Vocês são alunos basicamente de Direito e nós não podemos esquecer que ameaçar a democracia é ameaçar o Estado democrático de direito. Nós temos aqui estudantes que terão que defender o devido processo legal, a possiblidade de ampla defesa e do contraditório. Esse é o perfil do nosso aluno de Direito e esta é a diferença que os filhos da PUC levam no mercado de trabalho. Nós nos orgulhamos enormemente de vocês em razão da possibilidade de formação crítica e da possiblidade de termos uma argumentação aberta. Não há a possiblidade de termos uma democracia se não houver justiça social, diversidade e pluralismo”, disse a professora, dirigindo-se aos presentes.
Pra conferir como foi a palestra acesse : https://www.youtube.com/watch?v=AjOI2AolFK8