Às vezes, mesmo em dias atarefados, gosto de dar uma pausa e reparar no que está a minha volta. Muitas vezes vejo um lindo Sol, seus raios iluminando a grama, deixando-a com um tom esverdeado ainda mais bonito. Vejo também pássaros a cantar, flores colorindo a paisagem e borboletas… Quando percebo, estou pensando na grande variedade de percepções que a natureza nos proporciona e o quanto Deus é criativo e bem humorado, por ter criado tanta diversidade. Não deixo de observar também as pessoas à minha volta. Muitas estão sérias, muitas estão sorrindo. Algumas parecem estar muito atarefadas, algumas parecem apenas querer descansar uns minutinhos debaixo de alguma árvore. Mas todas possuem pelo menos algum comportamento já regulado pelo Código Civil.
Explico a última afirmativa acima: o Código Civil regulamenta, em síntese, a relação entre duas ou mais pessoas e entre pessoas e objetos. De forma exemplificativa, um dos temas tratados no ordenamento são os contratos. Um contrato nada mais é do que uma espécie de negócio jurídico que se traduz no acordo de vontade entre duas partes. Esse acordo não precisa, necessariamente, estar escrito e assinado em um papel. Não precisa envolver grandes quantias de dinheiro ou solenidades. Ao comprar um livro no sebo perto de casa eu realizei um contrato de compra e venda. Se combino com meu vizinho que não irei ouvir música alta das 14h às 15h realizamos um contrato, que incorpora uma obrigação de não fazer. Realizamos negócios jurídicos o tempo todo e não nos damos conta, uma vez que negócio jurídico nada mais é do que um ato realizado por qualquer um de nós com o objetivo de criar, modificar ou extinguir direitos, produzindo eficácia.
Compreender a presença contratual em nosso cotidiano assim como a principiologia que o envolve é encantador. Os princípios presentes nas nossas relações contratuais são subdivididos em “clássicos” e “modernos”. Os primeiros possuem como alicerces a autonomia da vontade, o consensualismo e a obrigatoriedade. De forma simplificada, eles podem ser assim compreendidos: o contrato deve ser cumprido. Ele é uma imposição criada pelas partes para que se cumpra uma finalidade (por exemplo, que eu saia da livraria sendo a dona do livro comprado). Essa imposição foi criada a partir da livre manifestação de vontade entre as partes e, uma vez que cada uma poderia desistir do contrato antes de ele ser celebrado não há motivos para não adimpli-lo. Entretanto, essa principiologia ganhou reforço com a chamada “nova principiologia”, que discorre, entre outros pontos, sobre a função social do contrato. Esta informa que a coletividade deve ser observada e respeitada desde o momento em que o contrato é celebrado. Assim sendo, os princípios clássicos deixam de ter caráter absoluto e passam a ser relativizados, controlados: a minha vontade de contratar está limitada pelo bem estar social. Por isso não posso realizar um contrato com uma fábrica para ela despejar lixo no mar. Esse contrato fere a coletividade já que contamina a fauna e flora marinha.
O Direito Civil perpassa nossos dias não só nos contratos. Pode ocorrer que decidi sair de casa com meu cachorrinho de estimação sem coleira e este mordeu um desconhecido na rua. E agora? A mordida gerou uma pequena lesão… E o direito civil também regulamenta essa situação. Desde que haja dano, o dono do animal deverá ressarcir o prejuízo causado pela mordida. Esse é um caso em que a responsabilidade civil é objetiva: independe da comprovação de culpa do dono do animal. Ou seja, este pode ter agido com todo o cuidado, mas se seu animal causou dano a outrem, ele será responsabilizado civilmente (a menos que comprove a culpa da vítima ou força maior). Voltando ao ponto do ressarcimento: ele pode o fazer por livre iniciativa… Mas e se não fizer? A pessoa que foi mordida deve ajuizar uma ação para cobrar essa indenização. Mas essa cobrança por meio do judiciário tem um espaço de tempo em que pode ser feita… Que também está regulamentado pelo Código Civil. São os chamados “prazos prescricionais”. O lapso temporal do exemplo hipotético é de 3 anos.
Além disso, há também as questões de família. Muito mais complexas do que pode ser legislado, mas mesmo assim regulamentadas pelo Código de 2002. Com quem deveria ficar a guarda de uma criança de pais que se divorciaram? Será que a melhor escolha seria dividir a guarda igualmente entre aqueles que se separaram? Essa forma de guarda é denominada “guarda alternada” e é proibida no nosso país. Proibida uma vez que através de estudos constatou-se que é necessário que as pessoas tenham um local para se sentir seguras… Um local em que sintam conforto, que saibam que lá é seu lar. Se a criança não possui estabilidade, se a cada 3 dias ela tem que arrumar as malas, tem que se “mudar de casa”, essa estabilidade não é criada, podendo causar transtornos para ela. O local em que ela vive deve ser aquele em que atenda melhor aos seus interesses. Essa é apenas uma questão tratada pelo Direito de Família.
O objetivo desse pequeno texto não é discorrer sobre os assuntos tratados pelo Código Civil. A finalidade, aqui, é ressaltar os vários acontecimentos que podem ocorrer em nosso dia a dia. Muitas vezes estamos tão atarefados que não paramos para observá-los: não observamos as várias espécies de contratos que nos rodeiam ou simplesmente não observamos as muitas manifestações e respostas que Deus nos dá. Devemos cumprir com nossas obrigações diárias, mas sempre preservando o lirismo presente no dia a dia. Poder perceber a presença de Deus bem como os frutos que ela gera em nossas vidas é motivo de grande alegria. Além disso, poder perceber as necessidades daqueles que nos rodeiam e ajudar sempre que possível também é essencial, é a prova de que podemos e devemos sim espalhar muito amor ao próximo. Afinal, “descobri que não há nada melhor para o homem do que ser feliz e praticar o bem enquanto vive”[1].
[1] Eclesiastes 3:12
Mariana Costa Martoni
Monitora de Direito Civil